terça-feira, abril 28, 2009

Além da cotidianidade demarcada pela aflição do dia

"Quando enfatizo que o meio é a mensagem muito mais que o conteúdo, - e não estou indicando que o conteúdo não tem qualquer papel no processo, - mas indicando que o conteúdo tem um papel diferente e não importante", diz Marshall McLuhan (1969) em sua famosa entrevista a Revista Playboy*. E continua: "Mesmo se Hitler tivesse pronunciado aulas de Botânica no rádio, algum político usaria o meio para reunir os alemães e iniciar as características negras da natureza tribal que criou o fascismo europeu dos anos 20 e 30." E continua: "Quando colocamos a importância no conteúdo e não no "meio, perdemos toda a chance de perceber e influenciar o homem" dizia McLuhan.

Passaram-se 40 anos desde esta entrevista e hoje isso não faz tanto sentido, pois na liberdade das narrativas, mesmo em um meio forte como a Internet, é o conteúdo que domina todas as ações subseqüentes ao processo de enunciados em convivência, pois só ele pode determinar a relação colaborativa e a união estável entre gerador e receptor.

Não existe mais o determinismo tecnológico de diferentes estruturas perceptivas desencadeando diferentes mecanismos de compreensão ou de significados. Se para McLuhan o meio e sua tecnologia institui a forma e o significado e determina o conteúdo da comunicação isso não acontece mais com a liberdade das vozes que se elaboram e colaboram em convivência.

O receptor hoje tem acesso às "fontes" e lá, estabelece um dialogo explicito e de seu interesse sem os intermediários fatais e seus universos particulares de significação. O receptor com acesso as fontes de informação arranja seus enunciados de uma maneira subjetivamente individualizada por suas preferências, independente dos canais formais de uma comunicação direcionadora e formadora de uma opinião padronizada.

A mídia massiva está ciente disso e contra ataca. Uma de suas reações é propagar dúvida na funcionalidade das condições autônomas e livres do fluxo de conteúdo, usando sempre, a máscara de uma ponderação séria e desejosa do dialogo com o maior publico comum.

Assim não foi surpresa encontrar na edição de um jornal periódico de grande circulação, no Rio de Janeiro, no domingo 26 de abril de 2009, três textos que com a intenção velada de esclarecer defendem a sobrevivência do privilégio da divulgação massiva.

Em uma mesma edição do referido jornal impresso um caderno indica que “as redes sociais podem ocasionar justa causa na perda do emprego” pela liberdade da informação nas mãos dos incautos trabalhadores; no outro caderno se coloca a irrelevância da informação do Twitter e um terceiro caderno traz uma entrevista, com escritor da moda, para mostrar os males trazidos pela velocidade da informação. Tudo bem arranjado como reportagens proativas e de esclarecimento,

Os três temas são de grande interesse para uma discussão transitiva, onde se permite a troca de enunciados. Mas em um meio intransitivo como é o jornal impresso, só uma voz tem a primazia da fala. E fala intencionalmente o que quer falar.

O periódico impresso mesmo sendo “global” está atado à terra da realidade quase estática. Está em um convívio com fatos e idéias de um cotidiano que vai de hora em hora limitado pelo marcar do tempo no relógio de um dia. Virtualizar traz uma mudança e uma passagem da terra para a mundaneidade do mundo. E nesta mundanidade as coisas explodem em fluxo, em uma sucessão de eventos em realização e em conexão. A virtualidade é um caminho que se percorre além da cotidianidade demarcada pela aflição do dia.

Aldo A Barreto

* Entrevista de Marshall McLuhan (1969) a Revista Playboy http://folk.uio.no/gisle/links/mcluhan/pb.html

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